segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

DEPOIS DO CARNAVAL...

A poetiza Cecília Meireles já dizia em um de seus textos: “Terminado o Carnaval, eis que nos encontramos com os seus melancólicos despojos: pelas ruas desertas, os pavilhões, arquibancadas e passarelas são uns tristes esqueletos de madeira; oscilam no ar farrapos de ornamentos sem sentido, magros, amarelos e encarnados, batidos pelo vento, enrodilhados em suas cordas; torres coloridas, como desmesurados brinquedos, sustentam-se de pé, intrusas, anômalas, entre as árvores e os postes. Acabou-se o artifício, desmanchou-se a mágica, volta-se à realidade”.

Nessas palavras extraídas do texto “Depois do Carnaval” (livro “Quatro Vozes”, Editora Record, Rio de Janeiro, 1998, pág. 93), a poetisa, professora, pedagoga e jornalista Cecília Meireles coloca dois pontos relevantes: a ilusão e a realidade.

Parafraseando as palavras da autora, poderíamos dizer da nossa atualidade: “Terminado o Carnaval, eis que nos encontramos com a violência e o caos na saúde pública: pelas ruas desertas, os mendigos pedem desesperadamente dinheiro para alimentar a fome que já dura há dias, e os meninos ‘cheirando cola’ para ficarem ‘doidões’. Eles perambulam pelas ruas com farrapos de roupas, magros, amarelos e encarnados, batidos pela dura realidade da vida, sustentam-se de pé entre os carros e os postes das avenidas do País. Acabaram-se os argumentos, caiu-se a máscara, volta-se à dura realidade de um país chamado Brasil”.

Quando a autora escreveu o seu texto, talvez não imaginasse que ele se adaptaria ao século XXI, como um referencial da realidade que norteia o “Gigante pela própria natureza”. Realidade que se impõe todos os dias e aprisiona os cidadãos de bem nas grades invisíveis da insegurança, fazendo-os reféns do medo e da criminalidade. Cidadãos que pagam os seus (muitos!) impostos, sem qualquer garantia de vê-los bem administrados na saúde, na educação, no esporte, no social e, principalmente, na segurança pública do País – atualmente um dos maiores desafios do governo. Esses cidadãos pagadores de impostos não desfrutam de nenhum benéfico advindo do pagamento de tantos tributos. A nação, como uma enorme fila do INSS, espera conseguir receber o retorno por esses tributos. Mas parece que todos os dias alguém lhes diz: “Acabaram-se as senhas. Voltem amanhã”. Quem sabe, depois do próximo carnaval!

“Depois do Carnaval”, o número de violência, de balbúrdia, de decepções, de engravidadas, dos que se contaminaram com Aids, dos mortos, dos roubos, dos... dos... sempre surpreende. E, diga-se de passagem, que nem todos os casos vão parar nos jornais.

Nessa época do ano, mais que em qualquer outra, o coração do homem fica totalmente desprovido do temor de Deus, sequer se lembram que Deus existe. Jesus, o Filho amado, morreu na cruz do Calvário para que pudéssemos viver a vida abundante, mas milhares de pessoas pensam encontrá-la em quatro dias de folia. Porém, depois da festança, o brasileiro se vê às voltas com as preocupações rotineiras e com as contradições estabelecidas pela “Pátria amada”, onde o rico fica cada vez mais rico, e o pobre cada vez mais pobre.

Porém, mesmo “Depois do Carnaval”, às voltas com a dura realidade, o brasileiro não perde o seu senso de humor. Aliás, essa tal “esportividade” é que bem caracteriza o brasileiro, mas que também o torna dúbio em suas emoções – sonhador, mas ao mesmo tempo cético. Ele acredita no País, mas esmorece quando a realidade “bate à sua porta”.

“Depois do Carnaval” ressurge a triste pergunta que não quer se calar: “Por que os mesmos investimentos destinados para este evento não são aplicados com tanto empenho nas questões sociais do Brasil? Alguém dirá que são... Mas, então, por que não vemos os resultados desses investimentos?” Essas são contradições de um país chamado Brasil... De um povo heróico...
Segurança, saúde, social... Certamente não encontraremos respostas convincentes para essas velhas questões. Porém... “Depois do Carnaval” vêm outros carnavais, por isso, cabe aqui, a frase final do texto de Cecília Meireles. Esta frase, por si só, nos dá uma noção da realidade vivida e contestada pelos menos favorecidos: “Mas, agora que o Carnaval passou, que vamos fazer de tantos quilos de miçangas, de tantos olhos faraônicos, de tantas coroas superpostas, de tantas plumas, leques, sombrinhas...? [...] Mas os homens gostam da ilusão. E já vão preparar o próximo Carnaval...”

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